Junior Vilela

Se crente não vota em quem bebe, por que quem bebe votaria em crente?
Essa pergunta, à primeira vista provocativa, nos leva a uma reflexão urgente sobre o que tem acontecido em Aparecida de Goiânia.

Essa pergunta, à primeira vista provocativa, nos leva a uma reflexão urgente sobre o que tem acontecido em Aparecida de Goiânia. Vivemos em uma cidade onde uma parte significativa da população adulta gosta de sair, confraternizar e aproveitar a vida noturna de forma responsável — e não há nada de errado nisso. No entanto, o que vemos na prática é um cerco crescente aos bares, distribuidoras e restaurantes, especialmente após a meia-noite.
Sim, estamos falando da chamada "lei seca municipal", que proíbe o funcionamento desses estabelecimentos durante a madrugada. E pior: quando há concessão de licenças para operar além desse horário, elas são liberadas de maneira seletiva, quase sempre em regiões específicas e, frequentemente, para quem tem os "contatos certos". Isso não é gestão pública — é privilégio institucionalizado.
O resultado? Quem quer curtir a noite precisa atravessar a Av. Rio Verde e buscar em Goiânia aquilo que Aparecida nega: vida noturna. Goiânia pulsa depois da meia-noite. Aparecida, por outro lado, vai se calando, se apagando, se tornando uma espécie de "Evangelistão", onde o poder religioso (mais especificamente, o evangélico) dita regras sobre comportamento, lazer e até política pública.
Não se trata de atacar a fé de ninguém — o problema não é a religião em si, mas sim o domínio religioso sobre decisões administrativas que deveriam ser laicas e pluralistas. O Estado é (ou deveria ser) para todos. A Câmara de Vereadores e a Prefeitura Municipal estão cada vez mais submetidas a um projeto moralizador que criminaliza o lazer noturno como se frequentar um bar fosse crime, como se quem bebe não pagasse imposto, não trabalhasse, não tivesse família e dignidade.
Chega disso!
A segurança pública tem o dever de proteger toda a população, não importa a hora. Pagamos impostos como qualquer cidadão. Não aceitamos mais ser tratados como marginais por querer aproveitar uma cerveja com os amigos depois do expediente.
Quer saber? No ritmo em que as coisas vão, poderiam fechar de vez os bares, restaurantes, boates, distribuidoras, choperias, cervejarias, botecos, etc., e deixar apenas as igrejas abertas. Porque é só isso que parece importar. E cá entre nós: igreja paga imposto? Quem sustenta esse sistema somos nós — trabalhadores, consumidores, empreendedores do setor de lazer e entretenimento, que somos sistematicamente ignorados.
Esse é um desabafo pessoal. Não aguento mais ver Aparecida se tornar um “Evangelistão”. Estamos perdendo a identidade de cidade plural para nos tornarmos uma extensão de um projeto de poder que não nos representa. Basta!
Está na hora de nos posicionarmos. De cobrar vereadores e gestores públicos. De lembrar que quem vota também se diverte — e quer respeito. Aparecida de Goiânia não pode ser reduzida a um reduto religioso com regras morais disfarçadas de legislação.
Se a cidade continuar nesse rumo, quem bebe e quem valoriza uma cidade justa vai continuar atravessando a Av. Rio Verde. Mas talvez o próximo passo seja atravessar também a urna.
COMENTÁRIOS